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domingo, 13 de fevereiro de 2011

Amizades no Trabalho

Psicólogos e consultores analisam como a amizade favorece o ambiente de trabalho, e apontam os perigos que podem trazer ao bom andamento dos negócios quando mal conduzidas
Janaina Pereira, revista Meu Próprio Negócio, edição 66 / agosto 2008

 
Na rotina de um adulto, onde os compromissos profissionais ocupam cada vez mais o tempo, o ambiente de trabalho é, inevitavelmente, um local com grande potencial para novos contatos e relações pessoais. Segundo Tom Rath, coordenador de pesquisas do Instituto Gallup, as amizades no trabalho têm impacto positivo em nossas vidas. A afirmação baseia-se em uma pesquisa, comandada por Rath, com a colaboração de outros pesquisadores, que analisou mais de oito milhões de entrevistas do banco de dados global do Gallup e, entre outras constatações apontou que quem possui um grande amigo no emprego tem sete vezes mais chances de se dedicar ao trabalho. Em outras palavras, é um ótimo negócio para as empresas estimular os relacionamentos entre os funcionários, pois esses vínculos aumentam a produtividade e o comprometimento.
Para a psicóloga Priscila Noro é natural que amizades se originem neste contexto, pois é no trabalho que as pessoas permanecem grande parte do dia. “Ninguém suporta passar tantas horas em um ambiente hostil. As amizades favorecem o bom andamento do negócio, uma vez que o ser humano se sente seguro ao estar inserido em local confortável e mais apto para o aprendizado.”
Mas a psicóloga ressalta que é necessário diferenciar a amizade de uma relação de cordialidade. “Em ambientes competitivos, pode haver outros interesses ao compartilhar dados pessoais da vida dos colegas, por isso é importante lembrar que há casos em que a relação de ‘amizade’ no trabalho também pode abrir possibilidades de prejuízos para funcionários e empresa”, adverte.

Cordialidade
Priscila Noro sugere que os líderes estimulem um ambiente mais cordial entre os colaboradores, demonstrando que há espaço para todos. Afinal, pessoas diferentes possuem talentos diferentes e, muitas vezes, quem é bastante criativo pode não ser tão bom na execução de uma determinada tarefa, e quem é bom na execução pode operacionalizar melhor do que delegar. “É assim que se forma uma boa equipe: pessoas com habilidades distintas, contribuindo de formas diferentes para um mesmo objetivo”, analisa. Por isso, a eventual falta de afinidade, tão necessária à amizade, não deve suprimir a cordialidade, que assegura uma boa relação entre pessoas, mesmo com perfis diferentes.
O psicólogo e consultor em RH Alan Bandeira de Melo é outro que avalia como benefício para as empresas a valorização das relações interpessoais no trabalho, e acredita que é possível existir, inclusive, amizade entre chefes e colaboradores. Entretanto, ele aponta que é papel do chefe saber conduzir a intensidade desta amizade de acordo com o perfil do funcionário, pois o respeito no trabalho, principalmente entre diferentes níveis hierárquicos, jamais deve ser perdido. Uma amizade saudável favorece um ambiente harmônico, um ambiente harmônico favorece o desempenho, logo as amizades ajudam a alcançar resultados e independem dos cargos ou funções.”
Em relação à amizade entre sócios, Bandeira de Melo adverte que a relação não pode resultar em interferência nos processos da empresa e, para isso, é necessário transparência e inteligência emocional.

Os contras
Mas nem sempre a amizade no trabalho é vista como algo positivo. Para a psicóloga Adriana Barros, a comunicação é vital para o bom relacionamento interpessoal, mas amizades muito próximas são prejudiciais. “As relações dentro do trabalho devem ser cordiais, mas a neutralidade é fundamental. Pode-se até ter convívio social, mas amizades muito estreitas podem prejudicar a rotina. Os chefes, por exemplo, tendem a proteger mais os funcionários com quem estabelecem um vínculo maior, e isso não é bom.”
Adriana aponta que em empresas menores e familiares, mais propícias a se estabelecer laços de intimidade entre as pessoas, deve-se tomar precauções especiais. “A empresa pode estimular o bom relacionamento, mas uma amizade verdadeira, em ambientes competitivos como vemos hoje em dia, é muito difícil. As pessoas devem observar se aquele que se aproxima é um amigo de fato. O ideal, no trabalho, é escutar mais do que falar e observar bem para saber avaliar com quem está se lidando”, recomenda a psicóloga.

Equilíbrio
A amizade por interesse pode existir, mas quem é equilibrado enxerga os relacionamentos no trabalho de outra forma. Esta é a opinião de Sâmia Simurro, vice-presidente de projetos da Associação Brasileira de Qualidade de Vida (ABQV), que acredita que em ambientes confiáveis as pessoas apresentam melhores resultados. “Em ambiente de harmonia é mais fácil crescer com a ajuda do outro do que sozinho. Mas a amizade tem que ser natural e os limites é você quem dá. É preciso respeitar a privacidade do outro e se sentir confortável com aquela relação. Não há necessidade de ‘amar’ todo mundo, mas ser cortês e simpático e dar liberdade para o outro falar e agir contribuem para estabelecer bons relacionamentos. Pessoas unidas são mais participativas.”
Sâmia acha que o clima competitivo das empresas hoje gera o medo nas relações, pois as pessoas tendem a imaginar que o outro quer ocupar seu lugar. Saber o que a empresa espera delas ajuda a estabelecer uma competição mais justa. “Cabe a empresa deixar claro que todos os funcionários terão oportunidades, assim a competição desleal não se estabelece e as amizades podem surgir de forma espontânea.”

Competição x Concorrência
Segundo o consultor Armando Pastore Mendes Ribeiro, da Pensare Consultoria, de Curitiba, para existir amizade entre os colaboradores de uma empresa é importante diferenciar competição de concorrência. “Competir significa que todos estão no mesmo barco, com o mesmo objetivo. Competição em si não é nenhum problema. Já a concorrência significa ‘eu venço e os outros necessariamente perdem’. Não há espírito de equipe. Cada um busca eliminar o outro, o que não ocorre na competição.”
Ribeiro aponta a colaboração e a cooperação como marcas de uma boa amizade. “Amigos são autênticos e podem nos ajudar até quando dizem coisas que normalmente não gostamos de ouvir.” Ele dá algumas dicas de como estimular as boas relações dentro de uma empresa. “Elogiar atitudes e comportamentos adequados e promover um encontro social para aprofundar o relacionamento podem ajudar nessa conquista. Entretanto, não é tarefa da empresa que todos sejam amigos. Não deve existir nenhum tipo de insistência para que amizades aconteçam, pode-se facilitar, mas jamais ‘forçar a barra’.”
O consultor alerta que “as empresas que apelam para o sentimentalismo, divulgando que são uma grande família, normalmente tem o ambiente horrível” e ressalta que bons ambientes de trabalho não necessitam que todos sejam amigos, mas que tenham consciência dos objetivos comuns a serem atingidos e, para isso, atitudes e comportamentos sadios são impulsionadores. “Uso um exemplo pessoal: tenho um parceiro de trabalho que é excelente e quando estamos atuando numa mesma empresa ou cliente, os resultados são acima da média. Mas, quando acaba o nosso dia, cada um vai para seus compromissos pessoais e não temos amizade. Por outro lado tenho um grande amigo, que ajuda nas horas difíceis, que está sempre por perto quando necessito e vice-versa. Tentamos trabalhar duas vezes juntos e foi um retumbante fracasso. Temos maneiras distintas de atuação e objetivos diferentes mas, ainda assim, somos amigos.”

Sintonia
Para Sheila Trindade Alves Pimentel, gerente de RH do Bristol Hotéis & Resorts, as amizades verdadeiras dependem de uma sintonia e aproximação incomum em um ambiente de trabalho, mas é possível que aconteça. “Desde que a amizade não atrapalhe as atividades profissionais e não leve ao favoritismo, pode ser bem-vinda em qualquer ambiente.”
Sheila acha que os líderes têm posição mais delicada em relação às amizades. “Os líderes ou proprietários da empresa tiveram de se acostumar com uma vida organizacional solitária, devido a responsabilidade de suas decisões. Uma decisão organizacional tomada com a influência da amizade pode implicar em erro. O líder deve estar livre de opiniões tendenciosas, de amigos ou não.” No entanto, ela acredita que a amizade pode ajudar a melhorar o relacionamento de qualquer pessoa em qualquer posição, desde que seja sincera.


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